sábado, 14 de novembro de 2009

Sobre os retalhos

Postagem nº 50! Em quase 4 anos de blog (é isso?!), dá cerca de um post por mês... É, eu gostaria de ter mais tempo pra escrever.

Em comemoração (?!), este post gigante com alguns recortes desta vida doida... Que, aliás, não têm que fazer sentido. Eu não faço, afinal.

"Que fique muito mal explicado
Não faço força pra ser entendido
Quem faz sentido é soldado!"
(Carlos Moreira)

E sigo Liviajando... ;)

***

"Tudo o que cala
Fala mais alto ao coração
Silenciosamente
Eu te falo com paixão
Eu te amo calado

Como quem ouve uma sinfonia
De silêncios e de luz
Nós somos medo e desejo
Somos feitos de silêncio e sons
Tem certas coisas que eu não sei dizer"
(Certas coisas - Lulu Santos/ Nelson Motta)


Às vezes fico revivendo tudo o que a gente passou, todos aqueles momentozinhos mais banais que a sua memória possivelmente já descartou, e que a minha ainda acalenta. E me lembro das vezes em que nos abraçávamos de leve, ou nem isso - só ficávamos muito perto um do outro, com os rostos muito próximos - e permanecíamos quietos, de olhos fechados, sentindo a respiração profunda um do outro. Muitas vezes nós fomos só uma confusão de mãos e bocas, e talvez por isso mesmo é que esses silêncios sejam incrivelmente marcantes. Mas desconfio que não seja só por isso. Porque, afinal, há tantas outras marcas...

"Não quero seu suor
Quero seus poros na minha pele
Explodindo de calor"
(Sentidos - Zélia Duncan/ Christian Oyens)


Gosto de encontrar seu cheiro na multidão sem rosto, e lembrar de nós dois imersos num mar de gente tensa e desconhecida. As mãos dadas, os corpos muito próximos - porque o lugar era apertado e cheio de gente, mas não só por isso - e a impressão de que minha força e minha leveza só estavam ali porque você também estava.
Gosto de sentir o seu cheiro nas minhas roupas, na minha pele, como se fosse você quem estivesse saindo pelos meus poros. Me faz sentir mais sua, mesmo que eu não o seja de verdade. E eu fico sentindo-o em inspirações curtas, na tentativa patética de gozá-lo ao máximo, mas poupá-lo pra que ele não desapareça de mim e você permaneça na minha pele por mais tempo.

"Quanta saudade brilha em mim
Se cada sonho é seu
Virou história em sua vida
Mas prá mim não morreu
Lembra, lembra, lembra, cada instante que passou"
(Tristesse - Milton Nascimento)


***

"Estou aqui
Mas esqueci
A minha alma num hotel
Meu coração na caneta
Meus desejos no papel
Eu vinha sem retrovisor
Um rosto estranho me chamou
E a minha pele não me coube mais
A sorte veio e me encontrou
Na corda bamba do amor
Meus dias nunca mais serão iguais

Estava ali
E confundi
Pensei que fosse o céu
O azul do mar me chamou
E eu pulei, de roupa e de chapéu
A onda veio e me levou
Desse lugar e agora eu sou
Uma ilusão, a solidão é meu troféu
Aquela foto amarelou
O riso no meu camarim
Felicidade bate à porta e ainda ri de mim"
(Pensei que fosse o céu - Vander Lee)


***

Dia desses me peguei com muita, muita saudade do Júlio, professor de Literatura. E saudade doída, dessas que a gente sente quando alguém muito próximo se vai - e essa proximidade nunca existiu de fato, o que faz a saudade não ter muita razão de ser, mas isso realmente não importava.
Lembrei de ter comentado com minha mãe, dias antes dele morrer repetinamente, do quanto eu queria assistir sua palestra d'O Cortiço este ano, porque o Júlio era o melhor contador de histórias que eu já conheci e O Cortiço era uma das suas melhores aulas. E aí doeu, porque eu queria muito vê-lo de novo, nos corredores e no tablado, mesmo que ele nem soubesse quem eu era.
Então lembrei da expressão tranquila enquanto me perguntava "Tá feliz?", e me peguei rindo sozinha de suas frases, sua interpretação, seu jeito de falar... E me lembrei do sonho que tive, alguns dias depois de sua morte (quando eu ainda estava entre incrédula e inconformada), em que ele aparecia e, com seu ar sereno, dizia que estava de passagem e precisava ir, mas que eu não me preocupasse porque ele estava bem.

Julião no Céu - Plajuliesco de Manuel Bandeira
(por Fabio Liberal)

Julião gordo
Julião doce
Julião sempre de bom humor

Imagino Julião entrando no céu:
- Tá feliz, São Pedro?
E São Pedro, contentão:
- Ai, carai, agora é que vai ficar bão!

Um comentário:

Anônimo disse...

Adorei o plajuliesco do Manuel Bandeira!

E eu me sinto meio como você. Assim, acalentando momentos que já passaram, e que provavelmente já foram esquecidos pela outra parte, mas eu guardo como meus tesouros mais preciosos...
E você também tem problemas com encontrar cheiros na multidão! Achei que fosse só comigo. Você tá lá, daí do nada, pá! Aquele cheiro inconfundível num lugar em que obviamente aquela pessoa não está, mas o cheiro dela ficou em você, por isso você fica sentindo o tempo todo.

=*** e suco de kiwi, vizinha querida!